segunda-feira, 10 de março de 2014

Pensares a conta-gotas (285)


A mulher procura amor,
o homem mais amor e sexo.
Ela quer nexo nos contatos,
ele finge mais, no ritual
de atos complexos.

A mulher se dissolve em afetos,
para dar conta do sexo completo,
o homem se liga menos a gestos,
se contenta a calor de amplexos.

Do enlace do raso e do profundo,
do divino e do mais profano,
resulta o mundo, humano e fecundo,
de duas mentes, dois juízos,
de dois desejos conexos,   
ímpetos e suaves sentidos:
um, de doação repleta de amor,
outro, também, de amor, comedido, anexo.




Quando posso,
ponho-me a pensar,
e me trespasso,
estático, estético,
e-nig-má-ti-co, emotivo,      
sintético, cômico,
trágico, até patético,
me acho.

Quando penso,
ponho-me a andar,
paro e passo, me revezo,
cruzando eixos, dialético,
ora sincrônico, ora seletivo,
ora sin-tag-má-ti-co,
ora pa-ra-dig-má-ti-co,
sempre a pé, pe-ri-pa-té-ti-co.

domingo, 9 de março de 2014

Pensares a conta-gotas (284)


Versos brancos, brandos,
ou bambos,
(o que importa a largura
de pernas e pés?)
de rimas escassas, pobres ou ricas,
sem precisão,
de menos flores, mais ardores,
mais  emoção,
soltos e livres, como nos abraços,
fortes ou lassos,
são o que de melhor ainda faço,
e desfaço e refaço
a cada leitura, de ocasião.



Dos pingos e respingos  
destas bagas, em estrada poeirenta,
caídas, como já outras,
e mais outras a bem molhar,
recolhe-se o barro,
com que se emoldura textos,
de consistências várias,
como em muros de ousadias
por querer chamá-los de poesia.

O poético, como a poeira, os ventos,
nascido de caminhos diversos,
íngremes, curvos, suaves, retos
paira acima dos invólucros das letras,
das tintas fracas ou das fortes cores,
para servir a todos com alma lavada,
os que dele se julgam merecedores.


quarta-feira, 5 de março de 2014

Pensares a conta-gotas (283)


Ladainha do medo
 
Viver o medo,
Viver de medo, com medo
Vivenciar o medo
A cada segundo, a cada minuto,
A cada apontar de dedo.

Medo de viver
Medo de morrer
Medo de não achar
Onde se esconder

Medo de ser
Medo de sair
Medo de chegar
Já de tarde
Ou já de manhã cedo

Medo de viajar, de falar,
Medo de saber
De estudar,
De se perguntar
Na filosofia do medo.

Medo pelos seus,
Medo per si,
Pelos teus, pelos nossos,
Pelos filhos deles
Que se desconhece
Se vão chegar.

Medo de tentar amar
Medo de dar, de se entregar,
De não se poder aguentar,
Medo de ignorar o que há
Do lado de lá do ar

Por que tem que ser assim,
Por que sempre foi assim,
Por que sempre será assim,
Por que medo de mudar?

Medo da insegurança,
Da violência gratuita, fortuita,
Muito medo mesmo
De não se poder enfrentar.

Como é que se conseguiu
Andar até aqui,
Nesse atual momento,
No convívio do delinquir?

Viver foi, é e será um perigo
À procura de abrigo seguro
A se debater consigo
Se é humano o reflexo
Esse mundo desumano
Injusto, desigual e dissoluto
A mais dissolver o absoluto?

sábado, 1 de março de 2014

Pensares a conta-gotas (282)


Haicais fingidos 25

Por que não sou
como quem admiro,
e me pré-firo?


Em três letras
me resumo:
uno!


O jota me inicia:
inovo, por ironia,
numa postura de ovo.


O esse de uma santa
me protege,
e levo como Ana.

 
Em dois prenomes
em caixa me resguardo:
Êta!

 
Não me aguento:
ou me seguro,
ou me arrebento.


Sou leão solitário,
apareço vivo
e sectário.


Não nasci vestido,
fui pescado nu,
em Brejo Comprido.


Enxergo invertido,
me vejo no espelho,
comum desejo.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (281)


Haicais fingidos 24

De madrugada,
as janelas de Mendes
me selvavam na insônia.


O sono não vinha:
as imagens, por sorte,
eram mais fortes.


Por que me dividia?
Não sabia, não sei,
nem saberei.

 

Sou a soma
e o resultado
de extra/di/ções?


Fui uma semente:
corri mais à frente
da multidão.


Por que nasci?
Não sei!
Me vinguei de mim?


Por que vim?
Achei melhor
sair por aí, finim.


Vou vi-vendo:
estou de rosto n´água,
me vendo!
 
 
Sabedorias antigas:

“O cavalo pediu frio,
até relinchar
de dor nos dentes.”


“A vaca pediu chuva,
até amolecer
a ponta dos chifres.”

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

pensares a conta-gotas (280)


Haicais fingidos 23 

Letras de muitas pernas,
o alfabeto tem pressa
de crescer a prole.  

 

Minha vontade:
ler os livros do mundo
no viajar vagabundo. 

 

Luzerna: um lampião
de luz amarela,
na escuridão. 

 

Quando menos se espera:
uma palavra cutuca
a inspiração. 

 

Soubesse ficar calado,
permaneceria mais
em mim. 

 

Candeia:
pavio no azeite se esquenta,
gut...gut. 

 

Quanta lembrança!
Melhor,
nem lembrar! 

 

Por que não sou
o que poderia ser,
torcido! 


Voltasse atrás,
limparia consequências
de heranças várias! 

 

Desabafos:
menos
os bafos! 


Bulling: assédio,
machucar-se
nos outros!

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (279)


Não careço olhar as horas,
quando procuro e não acho
o sono, que me revigora. 

Elas não me pertencem,
nunca dependem de meus relógios,
e horários lógicos. 

Aquilo que ora me estabeleço
parece a elas se referir,
na busca do que quero,
dormir, e desconheço. 

Sempre que dos fins recomeço,  
de confins, desse eterno evoluir,
imponho-me vontades de ir e vir
por longos instantes, padeço. 

 

Dependesse de mim,
não irias embora, assim,
como sempre faz o vento. 

Dependesse de mim,
ficarias dependurada, assim,
em meus galhos, de orvalhos. 

Dependesse de mim
misturar-te-ias, assim,
em meio às sementes das gentes. 

Assim, as horas passariam,
como desliza o tempo,
por entre átomos de vazios. 

Assim, sobe-se na árvore,
beija-se os frutos intumescidos,
lambe-se os lábios impolutos,
para se jogar em terra nua
a insistência da vida.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (278)


Existem arrependimentos
de pecados não praticados.
O tempo passa,
e não supera os traços,
dos desacertos do passado.  

Não se pode atrasar, cochilar,
andar de olhos nos bolsos,
com tantos planos a pensar,
que nos deixam sem escolher
de “à esquerda ou à direita, volver”.
 

Anda-se devagar, não se pode correr,
o fôlego é curto, o oxigênio raro,
e os olhos titubeiam, cada vez mais,
pesam os pensamentos, que sabem
que o tempo não pode parar,
um apenas momento no cais.


Gentes humildes, pequeninas,
cobrem de penas as esquisitices,
como galinhas acomodadas,
no ninho quente das mesmices. 

Em lugar de luz, preferem o escuro,
as lamparinas, as candeias,
o crepitar das brasas na fornalha
no borralho do fogão de lenha,
o desconforto, as teias nas telhas,
e o picumã das poucas ideias. 

Mas não carregam culpas a tiracolo,
por desconhecerem as idiotices,
de incultas plateias com torcicolos,
perdulárias das fanfarronices.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (277)


Anacronismos 

Deveras belas, as princesas amarelas dos pós
das passarelas da modernidade,
dos retoques nos desfiles, das pompas e riquezas,
dos olhares incrustados em faces de louça,
das peles brilhantes, de porcelana e pelúcia,  
das cores de céu nos olhos, nos cabelos, nos dedos de diamantes,
dos esculturados corpos, ditados pelo culto aos conformes,
dos príncipes encantados, a trazerem, a tiracolo,
as consortes sevadas nos sonhos, de feéricos castelos
e palácios de vidros! 

Nem mais se lembram, príncipes e princesas, do agora,
de antigos sossegos, provindos de tempos sem tempo,
quando súditos aplaudiam a real beleza, com as caras sujas,
sem enxergarem a crua herança das mesas fartas,
trajando misérias, pestes, fealdades do medo, 
e só conheciam quadros divinos, dos pintores complacentes,
como, agora, os príncipes e princesa nas lentes subjetivas
de fotógrafos e lustres.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (276)


Haikais fingidos 22

Entardece,
fantasmas se disfarçam,
tecem fantasias. 

 

Mapa mundi: o Canadá
estica as orelhas, arregala os olhos,
parece cabeça de lobo. 

 

Mapa mundi: a América do Sul
olha as costas da África,
lamenta a separação.
 
 

A criança fixa
o tempo que morre:
não tem palavras. 

 

O jovem fixa
o tempo que corre,
e se perde com o tempo. 

 

O moribundo esquece
os instantes que sobram
e fecha os olhos. 

 

Ao amor que não tive
escrevo com a alma
poemas de pesares. 

 

Pior é olhar para o passado,
não vislumbrar o futuro,
mesmo presente no escuro. 

 

Minutos de indecisão:
águas vão e voltam,
no pingar de chuva. 

 

Quem decide os caminhos
de ir à labuta:
pernas ou pensamentos? 

 

Faz tempo, o relógio
se esqueceu
de gastar o tempo. 

 

Cristalina, a água fresca
se espreguiça no cascalho.
O sol refresca os olhos.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (275)


Haicais fingidos 21

Por que festejar aniversário!
Mais lógico contar os dias,
com o passar dos anos. 

 

O mundo às avessas
são os desastres da sorte,
e da pressa. 


O sol não esconde o verde,
nem a sombra a verdade.
Peneira é transparente. 

 

A areia movediça
engole a vítima,
não a devolve à tona. 

 

Fazer barulho
nunca foi motivo
de se livrar do entulho. 

 

Do orgulho do leão
lucra-se o mínimo
da proteção. 

 

Para se diluir o feio,
realça-se a feiura,
menos freio na pintura. 

 

Da árvore à flor, ao fruto,
à semente da vida:
nova mente. 

 

Seriema quando choca
vira bicho
de se fazer asas e penas. 

 

Casa de janelas azuis,
a varanda pisada de brilhos
dependura redes ao vento. 

 

Bomba H:
o homem enlouqueceu,
perdeu a cabeça. 

 

Homem ou mulher,
X ou Y?
O último cruzou as pernas.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (274)


O que pensa Deus,
ao receber preces diversas,
de bons e maus pagadores? 

Fica, qual juiz inquiridor,
impassível, imparcial,
à espera de final feliz? 

Ou, por conhecer, de antemão,
quem é menos ou mais devedor,
já dispensa contas de penhor?
 
 
 
Oração do “bobo” 
 
Diz a lenda que um bobo,
de presença rara na igreja,
ao padre confessa a razão
das impiedosas ausências: 
 
“Faço minhas orações,
como as abelhas os favos,
defronte aos montes,
de lá onde moro e me demoro. 
 
Quando me levanto,
me lavo e oro,
só mente: “um, dois, três,
obras que Deus fez!” 
 
Alinhava, assim, de sons cavos,
mesmo que longe de luminares,
escravos de desagravos,
ou laivos de bafejos benfazejos,
nos azulejos frios de altares seculares.        

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (273)


Haicais Fingidos 20 

É sempre assim:
na hora do sim
o frio vem da barriga. 

 

Na hora H,
o falso herói se destrói,
roendo as unhas. 

 

É preciso andar
depressa ou devagar,
para se chegar a algum lugar.

 

Quem fica parado, some,
morre molhado,
ou seco de fome. 

 

Abrigo, sempre se acha
embaixo de árvore,
à sombra do umbigo. 

 

Andou correto,
nos horários do relógio,
ou do necrológio. 

 

Reserva-se o direito
de ser como é,
de viver como quiser. 

 

Fica cansado
a escutar o tempo:
tartaruga cala ao nadar

 

No dia D. o soldado
prestou continência
à sorte.  

 

No absurdo da guerra,
só não corre
quem morre no front.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (272)


Haicais fingidos 19

Onde dormem as sumidades,
teóricos da verdade?
Perderam-se na vasca da mente. 

 

Quantos heróis de livros,
desaparecem lívidos,
em névoas do olvido! 

 

Heróis conhecidos,
nascem nos livros
escritos por amigos. 

 

A magnitude dos heróis
se apequena
nas distâncias das histórias.  

 

Vaidade das vaidades!
Salomão fez e aconteceu,
depois, apodreceu. 

 

Pecado bíblico:
Davi mandar à morte
o marido da consorte. 

 

Para que céus vamos voar,
se nem mesmo asas
pudemos criar?! 

 

Pessoa feliz não usa camisa,
nem economisa os assovios,
para si mesmo. 

 

Imagens passam por nossas vidas
e desaparecem nas nuvens,
como almas.  

 

Pessoas infalíveis
desconhecem a razão
de ações de ocasiões..

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Pensares a cnta-gotas (271)


Haicais fingidos 18

A maior parte do tempo
andamos juntos,
com os pensamentos. 

 

Anda-se sozinho,
acompanhado
de atos impensados.  

 

Escolhas de rumos,
mil bifurcações
de difíceis soluções. 

 

A gata na janela
lembra esfinge
recoberta de flanela. 

 

Amor se encolhe,
não escolhe alívio,
mesmo em convívio. 

 

Mundo caótico,
fica-se caolho de olhar
o lado errado do ar. 

 

Se “julgo por mim",
imagine-se fosse
“para” os outros! 


Por que tanto pensar,
quanto mais procuro,
menos me acho?
 
 

O relógio se esforça
em trabalhar com tempo,
mas sofre parado. 

 

Quanto mais o tempo passa,
menos tempo sobra
para recomeços de manobras.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Pensares a conta-gotas (270)


Haicais fingidos 17
 

O universo:
grãos de poeira soprada
em tornados no infinito.  

 

Ideias incendeiam-se:
comodismo nunca foi
bom de ofício. 

 

Para fugir à realidade:
o bêbado embriaga-se
à liberdade. 

 

A onça dorme de dia:
luz intensa inebria
os maus pensamentos. 

 

A árvore abre os galhos:
para melhor enxergar
as penas dos passarinhos  

 

Periquitinhos verdes:
alaridos de crianças,
em festa de aniversário. 

 

Na mata, a orquídea veste
um lenço vermelho
no pescoço da árvore.  

 

Da rua, débeis vozes
acordam a luminosidade
diáfana da criança. 

 

A idade enfraquece
o tempo não insiste,
se esquece da inexistência. 

 

Papel aceita tudo,
menos o que estertora
na vasca da memória.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (269)


Ando dividido
entre instinto e razão,
mente e coração,
vontades ao longe,
e olhares perto do chão. 

Não sei bem,
se vou em frente,
ou se continuo
indefinido, adjacente
esquivando-me de decisão. 

Desconheço se sou
ou estou oculto ou aparente,
se, quando me calo,
ou falo de rompante,
é de irrefletida
tomada de posição. 

Debulho um pouco,
de todas as sementes,
em terras por onde passo, 
em todos os lugares,
por ser transigente. 

Vivo, assim, ambíguo,
ambidestro, ambicioso,
bissexto, ambivalente,
porque, anfíbio, só me findo,
noutro contexto e ambiente

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (268)


Aos amores preteridos,
jamais esquecidos, sempre presentes,
nunca passados, sempre queridos,
posto que duradouros e eternos,
confessa-se:  

Não se decide de rumos tomados,
por esses caminhos emaranhados,
de destinos traçados,
para serem seguidos. 

Existem regras, as mais rígidas,
a determinarem o curso das vidas,
a não se saber como teriam sido,
fossem diferentemente vividas. 

Opções são deixadas para trás,
como se jogadas fora,
até que chega o momento
de se entender o que ora vigora.  

Compensa-se, porém, o arrependimento,
com amores fatiados, divididos,
depois, aparentemente, largados,
sem o envolvimento, dantes pretendido.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (267)


Poucos leem,
menos, ainda,
poesia. 

Seletos e pacientes,
os que debruçam,
nas entrelinhas dos textos,
com objetivas lentes,
à procura de fantasias. 

Em dentes de pentes,
em elos de joias, bijuterias,
e mais tantas correntes,
há súbitas harmonias
saindo de dentro da gente. 

 

Não leio somente poetas letrados,
consagrados no palco
de meu questionável, 
momentâneo agrado. 

Leio os iniciantes, titubeantes,
claudicantes, cheios de desejos,
mesmo que latentes,
que não mentem suas sementes.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (266)


Haicais fingidos 16 

A dor só dói
no paciente doente,
dono do dente. 

 

Ó! inconsciência infeliz!
O injusto juiz
é improvidente! 

 

O instante se esvai,
aprisiona-se mundos paralelos,
em fingidos haicais. 

 

Quando se queimar o sol,
no céu, nem uma nesga de azul
escapará do breu. 

 

Tudo se apaga,
somente a consciência
se propaga. 

 

Sem alma, sem passatempo,
prédios se amontoam na janela,
não se desmorona o tédio. 

 

Fogo, terra, água, vento,
contos contados da alma.
Vida desafia o progresso. 

 

De espaço e tempo,
aflito, me perco,
neste cerco infinito. 

 

Medo de esquecer,
o passado me atormenta,
o que adiantam lembranças? 

 

Há os que procuram o melhor,
outros, o menos ruim,
neste mundo chinfrim. 

 

Por que brigarmos,
se nem sabemos a razão
da discussão! 

 

De que lado o certo,
nesta contenda incerta?
Há nuvens brancas no azul.  

 

O céu não tem limites,
o tempo inexiste,
em que desencanto fico ?

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

`Pensares a conta-gotas (265)


Haicais fingidos 15
 
Haja emoção!
Coração calado
grita mais alto. 

 

Parentes, serpentes,
concorrentes naturais,
ou preferenciais? 

 

Mentira sugere às avessas,
na mente de quem ouve
e se interessa. 

 

No império da mentira,
só não se convence,
o operoso mentiroso. 

 

Mentira, de foro íntimo:
o autor se esconde
de seus mal-ogros. 

 

Mente-se pro mundo,
não se mente
pro fundo. 

 

Mentira usa recurso
impiedoso,
à mão do mentiroso.

 

Mentira tem pernas,
se longas ou curtas,
importa o pé na porta.

 

A gata ronrona,
não raciocina,
pensa com o estômago. 

 

Formigas, seletivas,
preferem se fartar de mel
e bolos, em particular. 

 

Moscas e formigas
desfrutam deleites:
vinagres, à parte, e azeites. 

 

Parentes aos extremos,
a serpente da saúde,
ora placebo, ora veneno?

sábado, 18 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (264)


O que escrevo, será?
o contrário do que penso,
do que costumo dizer
ou sonhar? 

Ou somente soo dissonante,
desavisado do que me brota,
em vão de peito,
de desvãos sem fundo? 

Serão, acaso, semitons,
notas breves e graves,
como quando ronquejo,
em sono profundo?
 

 

No escuro da noite,
o ser humano se esquiva,
não se enxerga,
corre a se esconder
atrás do muro. 

Durante o dia,
a luz ofusca-lhe a vista,
de limitado brilho,
e, ocorre, balbucia
alguma poesia.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (263)


Haicais fingidos 14 

Príncipes, princesas,
glamorosa realeza.
Miséria põe a mesa. 

 

Quem faz farinha de osso,
melhor faria negócio,
com os ócios do ofício. 

 

Aves, aves de rapina,
todas benditas, divinas,
inimigas do desperdício. 

 

Políticos chegam de fora,
carregados de escórias.
Brasiliense leva a lama.

 

Água jorra indiscreta do barranco,
não para de correr.
Quem deixou a torneira aberta? 

 

A beleza nasce do peito,
e não do jeito de ser
perfeito. 

 

Nuvens carregadas, ameaça a chuva.
Tiro o chapéu, abro o peito:
Atirem-me, com balas de água! 

 

O cerrado demorou a crescer,
a solidão cavou em terras ácidas,
retirá-lo de lá, por quê? 

 

Desprezo dói,
corrói devagarinho,
alma se mói em pedacinhos. 

 

O sol castiga, alimenta fadiga,
o corpo não se entrega,
morre banhado de esperança.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (262)


Antes, assoviava aos passarinhos,
livre das jaulas, bem baixinho,
até nas salas de aulas,
distraído com carinho e alma. 

Hoje, ainda, os imito, devagarinho,
pelos cantos, tocado de desejos, 
assoviando, como andejo, reprimido,
por me sentir sozinho. 


Bichos não inovam
no seu conviver diário.
Coerentes, autossuficientes,
são isentos,
quando matam e comem,
por missão de berçário. 

Homens não são solidários,
inovam, inventam,
matam e somem,
sem comiseração,
com quem reprova
seu ideário sanguinário.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (261)


Aconselha-se, sobremaneira:
não andar com os olhos no bolso,
não se fazer de bom moço,
não gastar o sal do almoço,
deixar de lado os ócios,
não roer o duro osso,
do que se puder comer
com merecido gosto de viver. 

 

Em Roma pedia-se “aqua”!
Agora, ao mundo, pede-se “water”!
Logo, da Asia, pedir-se-á Feng Shui? 

Chegará a hora de se pedir “água”,
insípida, inodora e incolor,
ou morrer-se-á de sede, frio ou calor. 

No final da caminhada, porém,
haverá outros povos, menos novos,
(se, ainda, reinar o bom senso),
da Papua, Nova Guiné, Amazônia,
simplesmente, a estender as mãos,  
molhadas de rios, brios e coração.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (260)


Não se pode conceber, nesta vida,
o que está reservado,
após a derradeira partida. 

Há quem afirme nada acreditar
em transcendência do ausente,
outros, já, ciliciam-se por ignorar
a imanência do evidente. 

Mas, o que advirá, ou não,
da conclusão, é o frio imenso,
a cobrir corpos, dados ao chão. 


Os santos da verdade,
os incompreendidos atores,
do palco das dores,
só serão benditos,
se entronizados, com louvores,
nos altares do outro lado. 

Deles, nem a história costuma se lembrar,
muito menos, os absolverá, desta lida,
de miúdos e supostos pecados,
com os rigores indevidos,
por ser, a balança humana,
pouco ou nunca aferida.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (259)


Quando não se sabe o que fazer,
e nenhum outro mister satisfaz,
comprova-se, então, estar devedor
do que não se conhecia capaz,
que não fosse apreendido de cor. 


Viagens

O tempo ora demora, ora passa depressa,
como raio e trovão na tempestade.
Quanto mais apressado, mais depressa passa,
e se anda devagar, mais se faz esperar. 

Passar pelo mundo, um passear de instantes,
aqui, acolá, experimentar-se sortimentos,
de nula munição, guerras e contendas,
e comprovadas e já listadas encomendas. 

Pessoas, viajam juntas, fazem o mesmo trajeto,
cada uma a seu jeito e ritmo, ditados em próprio projeto,
em cumprimento de buscados desfechos,
no confronto de íntimos conflitos previstos.  

As viagens, sempre ligeiras, são nuvens passageiras,
e limitam pesares nos desvãos das estradas,
nem permitem indagar das próximas paragens,
para suprimentos de mais peregrinagens.

Enquanto isso, o tempo,
que nem é tempo,
passa depressa e devagar,
sem qualquer interstício entre ir e voltar.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (258)


As encruzilhadas 

Não sei, se cheguei, ou não,
onde já deveria ter chegado,
ou se chegarei a lugares aguardados.
Por acaso, desviei-me no caminho,
em algumas dessas encruzilhadas
do inesperado? 

Tempo, não há mais, que pena!,
nesta atual jornada de aprendizado,
para retornar-me aos pontos
dos enganos,
que já não me restam mais
sobras de anos. 


Quando se olha para trás,
por se sentir perdido,
desanimado, frustrado,
em caminhos já escolhidos,
o arrependimento fere fatal,
nem permite conversão,
ou total mutação de ser, 
em sodômica estátua de sal?

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (257)


Haicais fingidos 13
 
Imagens fugidias,
a cabeça não acompanha
pe/r/nas de cada dia.
 
 

O pão nosso de cada dia
é dado aos que o comem
a suor amassado.


Sem esforço,
nem osso enterrado
há de ser encontrado. 

 

Leão solitário,
sem direito de mando,
vive errando. 

 

De ponta-cabeça,
o salto-mortal é certeiro,
ou derradeiro. 


Na pressa, come-se cru,
chega-se logo ao pouso,
os pés lacrimejam. 

 

Das janelas dos instantes,
voam plumas lisas,
na leveza das brisas. 

 

Meio-dia, o sol reverbera,
no telhado da casa,
luzes trêmulas. 


Voz no descampado,
fere a paz, o silêncio
foge no vento. 

 

Tapera, casa abandonada,
terreiro esquecido,
cobras se refestelam ao sol.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (256)


Haicais fingidos 12 

No andar a pé,
ideias não se cansam
de vagar. 

 

Pernas fatigadas,
devaneios, sem freios,
desandam a passeios. 

 

Adrenalina exsuda medo,
vai à cabeça, perde a razão,
e se esvai no etéreo. 

 

Tintas projetadas,
o quadro se cria,
à revelia dos pincéis. 

 

Desconfie da memória,
que não guarda mais
os anais da história. 

 

O sexo se arrefece,
soçobra o ânimo,
uma luz se apaga. 

 

Depois das festas,
de novo a casa.
Solidária, a solidão! 

 

Vidas sem calendários,
os dias sem contas,
são aniversários.  


Célere, cai a tarde,
o fulgor se esvai.
À noite, o silêncio! 

 

Pianista não carrega piano.
Das teclas vai retirando
a ligeireza dos anos.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Pensares a conta-gotas (255)


Haicais fingidos 11 

Ano novo vem,
ano velho vai,
lembrança vai e vem. 

 

Sempre atento,
o vento se infiltra,
nas frestas do tempo. 

   

O homem sobe no ringue,
enfrenta outro animal,
seu rival. 

 

O que faz o dinheiro!
Quebra os ossos,
deixa inteiros os bolsos.
 
 

A solidão é fria
sensação de falta
de empatia. 

 

Tome cuidado!
Aí, vem você,
feroz, forte e armado. 

 

Banal como a morte.
A mosca esvoaça,
desavisada da sorte.
 
 

Rápido, como mosquito
esfregar o olho,
de ante a mão armada.  

 

A criança não mente,
experimenta fantasias
que sempre inventa. 

 

O cavalo sonolento
espanta as moscas
com rabo e vento.