sexta-feira, 31 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (195)


(À mes amis, pèlerins à Saint Jacques de Compostelle)
 
L´impondérable du chemin
ralentit les pas des pèlerins.
L´abattement, parfois,
vient de la fatigue, du dégat.
La dépêche dans l´allure
passe au lent, avec le temps.
Les montées et descentes
renvoient aux analyses de la vie.
L´épineux c´est le poid des heures,
soulagé par les rêveries.
L´aisé ce sont les terrains plats,
lequel, en renforçant, donnent l´élan. 

Celui qui chemine, solitaire,
devient plus humain,
et, pour se faire solidaire,
change de lettre, au vocabulaire.



O imponderável do caminho,
atrasa os passos dos peregrinos.
O desânimo, quando acontece,
provém da fadiga, do cansaço.
A pressa no andar passa
a devagar, com o tempo.
As subidas e descidas
levam às análises da vida.
O difícil é o peso das horas,
atenuado pelos devaneios.
O fácil dos trechos planos
dá forças, revigora os ânimos. 

O caminhante solitário,
se torna mais humano,
e, para se fazer solidário,
muda de letra, no vocabulário.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (194)


(Lembrando Quincas Borges)

 
O avô dizia: esperava pelo dia,
não deixava a noite chegar,
sem avisar, ao calcanhar,
com serviço ainda no balaio,
por terminar. 

O sol era o fulcro de sua miragem,
na contagem das horas,
a guiar o dia, as coragens
e fadigamentos. 

Antes de buscar o sono, a lua silente,
no distante firmamento,
luzia de convidar as mentes
a brincarem de esconde-esconde
nos claros-escuros das nuvens. 

Quando a madrugada tardava
a perscrutar gretas de telhas,
frestas de janelas,
ele acordava para aguardar
o dia, sempre esperado,
nunca de hora tardia.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (193)



O domingo tem silêncios de crianças,
dormindo à sombra de paisagens tristes,
a não se saber o que fazer do lazer,
de mais sossegos e de menos tumultos. 

Aguardam-se segundas, semanas, vida inteira,
para um renovar de pensamentos fecundos,
para não se contentar de alegrias poucas,
e grandes porções de solitários mundos.
 


 
Sinto o que sente
um velho solitário,
ao se ver no tempo da morte,
vencido pela própria consorte. 

Desenovelando o quase acabado novelo,
relembra, do início, os terços do rosário,
desfiados com as dezenas das penas,
separadas em partes iguais,
apenas do etário pesadelo.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (192)


Evanescência 2
 

Por que Nava escrever
tão lindos e acabados textos,
para depois morrer
de desgosto? 

Por que poetas
pensarem bonitas imagens,
para ficarem à margem,
na poeira que se apaga
em um só soprar de vento. 

Por que pintores pintarem
tão perfeitos rostos,
para os deixar expostos
a olhares rápidos e toscos? 

Por que viver tão pouco tempo,
nesse ponto perdido de mundos,
para pouco ou nada levar de volta,
por obra de transitória existência? 

A vida é mesmo deveras curta,
ou as contraídas dívidas
serão pagas a penas, em parcelas,
nessas infinitas janelas,
de tempos em tempos?

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (191)


Evanescência 1 



Nava conhecia, como raros,
os segredos da vida,
mas nada pôde afastá-lo
da já traçada divisa:
“médico, cura-te a ti mesmo”. 

Sem ser pintor das dores,
misturava os tons das cores
em tintas de trinta e cinco anos
de cogitação, insone ou acordado,
da janela de onde morava.  

Diante de si, havia o mar,
e as luzes de Niterói, ao longe.
A coloração, com o passar do dia,
ia se matizando, e as incógnitas
alimentavam o que escrevia.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (190)


(Ao assistir cantar a Helene Fischer)
 
O rosto, o mais lindo,
a voz, a mais su/ave e doce,
o mais definido corpo,
ânimo de musa no palco,
no mais purificado gosto. 

Vazavam olhares do público,
misturados a desejos cúpidos,
porque a vida não é insípida,
assim, una, curta e irresoluta,
e os céus não são relativos,
embora longes, infinitos, divinos,
ou, até, inacessíveis e absolutos.

 

(Lembrando Chico Buarque)  

Sem forçar a letra
a caber-se na música,
sem forçar a música,
a conter-se na letra,
o artista casa duas parentes,
com arte, disciplina de lente,
num só momento de alento,
sem doutrina de casamento. 

A beleza é a soma do todo,
natural, sem qualquer adrenalina,
ignorante de qual nasce primeiro,
das gêmeas univitelinas,
iguais na harmonia e sonâncias,
diferentes na sina do roteiro,
sem pacto com a rotina. 

 

Às vezes,  anda deprimido,
comprimido, reprimido,
espremido, sisudo,
distraído do mundo,
às viras e voltas com tudo. 

Esteta tímido, o poeta
desajeitado e mudo,
desconhecido, escondido,
é bem mais re/voltado,
do que, antes, l/ido.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (189)


(Esperando voo, em 28/4 – Saint-Exupery)

 

No aeroporto de Lyon,
em tempos de aguardo,
crianças brincam seu tanto
de infância e liberdade,
gritam, correm, não se cansam,
distraídas do mundo adulto
e da velada ansiedade,
colada nos rostos imigrantes. 

A pureza da alma não carece
de palmas, de preces, de prantos,
ou de mantos que a recubram,
tampouco de aparentes indultos
de mundialidade, cheia de dívidas,
vazia, de ilusórias dádivas
e angustiadas dúvidas.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (188)


Águas verdes do degelo,
do desprezo e dos olhares frios;
Barrigas verdes da fome
e do desmazelo dos brios;
Consciências verdes da omissão,
e da falta de devoção e zelo. 

Não me sinto levado, por obrigado,
a rezar em códigos e línguas.
Rezo mudo, em pensamentos,
em qualquer canto de mundo,
quando penso ser o agora
a hora dos sacramentos. 

Os templos são abandonados e frios,
escuros, úmidos e solitários,
que, até, os santos inertes,
que os habitam noite e dia,
parecem tristes, coitados,
diante do sacrário e da sacristia. 

Lá fora, a natureza se excede em atos,
quente, clara, como gente solidária.
Flore de mil tons, como Deus sempre quis,
o bastante às pessoas levantarem o nariz,
e dizerem felizes, sem pejo e mesquinhez:
“obra maior que Deus fez”.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Pensares a conta-gotas (187)


À mes amis de La Voie « Podiense » (Du Puy-en-Velay à Espalion), du 19 au 26/4/13

Devant moi, il n´y a que le devant.
De fois, j´accompagne mes pas,
de fois, ce sont mes pas
qui m´accompagnent, en avant.

Le vide des espaces, l´incertitude de l´arrivée,
parfois, me poussent plus loin que moi.
Je ne sais pas si ce sont les desarrois qui me suivent,
ou, alors, les élans qui visent mes devants.

Mes pensées, certes, me pressent les pieds,
bien qu´ils s´enlourdissent, de plus en plus,
aux mouvements qui montent et qui descendent les ravins,
en s´éloignant du bon coeur du matin.

C´est le chemin à me guider dans ses horizons,
c´est ses montées, à m´essoufler les poumons,
c´est l´haleine, à me couper, en pleine impulsion,
c´est ses descentes, qui me font ralentir les poids.

Mais, heureux, les sentiers plats me donnent de l´âme,
l´air des bois s´opposent aux caillous pointus détachés,
pour que je continue un peu plus en avant de moi-même,
vers ces devants de l´idéal lointain qui m´emmènent.

Il y a 4 ans, en Espagne (avec traduction, plus loin):

O “Camino” do peregrino compostelano  Joaquim Caixeta ( jcaixeta@uol.com.br, 22-25/7/09)

O caminho e seus carismas,
suas idiossincrasias e preferências,
seus prismas, seus limites,
seus ritmos e ânsias
de irrelevantes distâncias.

O caminho sem ser corrida,
ou renhida competição,
segue os passos da vida.

O caminho: um terço traçado que se vai rezando,
à medida que se vai andando,
na larga da imensidão
de nossas sempre crescentes solidões.
Uma “ensalada” de culturas, de línguas,
que se vão encontrando, convergindo,
das mais diferentes direções.

O caminho é pessoal como um texto
que se lê, diferente-mente,
a cada espaço, a cada olhar,
no cadinho do contexto das leituras.

O caminho: um andar reflexivo,
um descaminhar no silêncio,
um testar de paciência, de consciência de si,
de ciência e de procura do outro,
do caminhante como semelhante,
de encontros, de desencontros,
de reencontros e de despedidas,
de visões, de revisões, de transparências 
e de transcendências de carências interiores,
sem temores e sem dores.
 de amores tecido.

O caminho: um buscar de paz,
de convivência sem veneno,
de irmandade em comunidade,
de diálogo possível de entendimento,
mesmo em sementes de diferentes culturas.

O caminho e seu traçado natural,
sem fronteiras, sem cercas ou porteiras,
pode bem ser um canto cantado,
de encantos e recantos inusitados.

O caminho sem ser dos Estados cedentes,
tem sua história e tradição,
em condomínio universal,
mesmo sem deixar de ser pessoal.

No caminho, vai-se andando, falando,
se convencendo, se entendendo,
escutando, aprendendo,
amando o diferente nas gentes.

No caminho, os pensamentos carregam os passos,
as distâncias das estâncias vão se encurtando,
chegando para mais perto do Alvo Santo.

No caminho, aprende-se a caminhar devagar,
mesmo sabendo
que muito mais ainda há o que caminhar.

O caminho, um sobe e desce,
um desce e sobe, em única mão,
é também uma prece,
uma oração de união
que se reza e não fenece.


Le “Camino” du pèlerin à Compostelle. Joaquim Caixeta ( jcaixeta@uol.com.br )

Le chemin et ses charismes
ses idiosyncrasies particulières,
ses prismes, ses limitations,
ses rythmes propres,
des distances sans importance.

Le chemin sans être une course
ou une dure compétition,
suit les pas de la vie.

Le chemin: un chapelet tracé qui se défile
au fur et à mesure que l´on chemine
dans l´immensité du vide
de nos solitudes toujours pressantes.
Une “ensalada” de cultures, de langues,
qui se rencontrent, qui se convergent
des plus différentes directions.

Le chemin est individuel comme un texte
qu´on lit, differemment,
à chaque espace, à chaque regard
dans le creuset du contexte des lectures.

Le chemin: une allure réfléchie,       
un défaire de chemin dans le silence  
une épreuve de pacience, de conscience de soi
de science et de recherche de l´autre,
du chemineau, tant que semblable,
de rencontres, de séparations,
de nouvelles rencontres et des adieux,
de visions, de révisions, de transparences
de transcendences, de besoins interieurs
sans peurs et sans douleurs.
Rien que d´amours tissé.

Le chemin: une quête de paix  
dans la vie en commun sans poison
dans la fraternité en communauté
dans la possiblité du dialogue et de l´entente
même si les semences sont des cultures différentes.

Le chemin et son tracé naturel
sans frontières, sans enclos et clôtures,
peut bien être une chanson chantée
dans l´enchantement des endroits inusités.

Le chemin, sans appartenir aux Etats cédants,
a son histoire et sa tradition
dans un copartage universel
même en étant personnel.

Sur le chemin, on marche, on parle
on se persuade, on s´entend
on écoute, on apprend,
en aimant ce qui est différent dans les autres.

Sur le chemin, les pensées portent les pas
les distances des parages se reduisent
pour s´approcher de plus en plus du But-Saint.

Sur le chemin, on apprend à cheminer en douceur
même en sachant
qu´il en reste encore beaucoup à cheminer.

Le chemin, un monter et descendre,
un descendre et monter continuels,
est aussi une prière
un surplus d´appel au fraternel  
que l´on fait en priant
et qui ne termine plus en avant. (25/08/09)