quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Nuvens esparsas (44)

Vai e vem em rua apartada

Casa velha, telhas quebradas,
tapera de recordações,
vidas passadas, agitações,
moços-meninos, meninas-moças,
cheios de ânimos e graças.

Pais, tios, avós,
postergados da memória.
A rua, agora, transparece nua
de antigas vitalidades,
animada procriação de outrora.

O tempo leva, passa, repassa,
abrasa lembranças, saudades.
Tempos chegando,
tempos novos se inovando,
remplantados ovos de contínua idade...

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Nuvens Esparsas (43)

História de rio e mar
(de Guarajuba e mais beira-mares / 3 a 9/2/17)

Este rio não é, assim, tão longo e largo,  
tão só risonho ou mau humorado,
mas, sedento de espaços,
acontece ter ímpetos irados.
Inúmeros fios d´água o alimenta,
de chuvas ou veios de solos pedrentos,
nasce em montanha de pouca monta,
e chega, sem saltos e barrancos, solavancos demasiados.
Corre ora ligeiro, ora pausado,  
sem parecer cansado, brinca com peixes miúdos,
briga no desgaste de pedras agudas,
que ousam cortar-lhe caminho traçado.
Amealha substâncias ricas, de provisões,
lava cascalho nas águas enrugadas dos ventos,
avança resoluto, absoluto de tempos milenares,
por meandros e distâncias de chãos diversos.
Carreia terra misturada a correntezas barrentas,
derrama lamas pelas margens e banhados,
onde crescem ramas de densa floresta,
e espelha céus de poucas nuvens e muitos pássaros.
Já perto do mar, os entretenimentos,
mangues fervilham criaturas de pernas peludas,
arbustos arqueam esqueletos esquisitos, extraterrenos,
para efeito de dar vazão a sedimentos.
As águas, enquanto isso, de mansinho, se adentram no mar,
(enorme e barulhento, guardador de mistérios profundos,
tudo, ali, é sério e raivoso, colosso, tenebroso, barulhento,
prodígio de gigantes, sem conta).
O mar é gordo e guloso, sua fome tanta,
que tudo come, engole de pronto, ligeirinho,
confundindo lodo com areia,
e envolvendo o todo de sal marinho.
Dali pro fim, o rio não é mais rio, marginado,
são arcos coloridos de alvuras e espumas,
texturas de verde e azul em fundos infindos,
nesgas em telas de cinza e sangue derramados.
Lá, bem longe, o céu aperta de abraços horizontes imensos,
e brinda olhares fugitivos com mais amor, menos dor e danos,
porque o riomar ensina humildade, cheio de graças,
                  ao ser humano, ameno, bem frágil e pequeno.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Nuvens Esparsas (42)

Limitação

Quantos me divisam
no lusco-fusco, de relance,
pelas costas, de lado, de frente,
ao alcance da mão,
ao longe do olhar, ausente!

Meu limite de estar é ter de ficar
em exíguo compartimento,
a amealhar parcos experimentos,
sem sequer poder compartilhar
desalinhados pensamentos.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Nuvens Esparsas (41)

De frustradas vontades,
esgoto possibilidades
de provar experiências,
a contra-gosto
de contínuas exigências.

De repetidas reticências,
nasce desejo de revelações,
destacadas tendências,
aprazíveis sensações,
atávicas carências.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Nuvens Esparsas (40)

Beleza não escolhe corpos
para se corporificar.
Tamanho de mão pouco importa,
para provocar encantos.
Vale mais o desejo que o beijo,
o trejeito que o jeito.

Felicidade se revela nos poros,
sorrisos, comissuras e cantos,
de dentro para fora, 
mente e boca e coração,
com efeitos de puras contraturas,
de continuada purificação.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Nuvens esparsas (39)

Pretenso dono de mundo
sem dono,
de poderes
maiores que o homem.

Mundo de desterros
que gera depois come.
Esferas nano-colossais,
de leis gerais-parciais.

Mundo de estrondos,
nem velho nem novo,
ovos de novos mundos,
embriões de tudo de novo.

Mundão, assim, perambulante:
de déu em déu,
rodas de céus, mundaréus,
de Deus e Deus.

Mundo de forças tais
micro e macrocósmicas,
tacanhas e tamanhas,
sem rivais, sem fim, sem começo,
que de minhas insignificâncias,
exerço e meço de pensares e tropeços.