segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (234)


Vão pingando gotas,
do conta-gotas,
por onde passo
e me espalho,
que traduzem luzes,
(até cruzes)
sem conta, gotejadas,
como contas-de-lágrimas,
ou como gotas de orvalho,
destiladas a migalhas,
de manhã, de noite estrelada,
ou de madrugada. 

 

Isso é sonho ou graça,
ter a ciência de graça,
além do relógio da praça,
da alma branca da criança,
a brincar de ausência,
com sua inocência? 

 

Quando você
ainda não era,
já, eu, era eu,
quem concebeu. 

 

Se mexem comigo,
as inquiet/ações,
de uma em uma,
de dez em dez
a foro íntimo,
sinto e minto.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (233)


Palavras não se medem
e se soltam, assim,
tão fácil, da mente
ou do papel consciente,
(onde nasceram).
 
Entram nas almas receptivas,
pelas janelas e portas da frente,
e dizerem, em linguagem diferente,
mesmo que em tom de infantes:
“perscrutem-me, apenas, um instante,
para que lhes diga ter valido a pena
interromperem, um pouco, o sufoco
dessas agitações persistentes,
para se dignarem sentir, humildes,
meu hálito quente”. 

O poema tem que dizer
coisa com coisa, repassar emoções,
que as pessoas entendam,
num piscar de olhos
ou batida do coração,
sem precisarem de traduções
comoventes.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (232)


O mundo me parece enlouquecido,
bem mais do que sempre esteve,
conforme se comprova
nos meandros da História. 

As pessoas batem menos
com as mãos na consciência,
e os bolsos ditam as regras
das atitudes incontestes.

Os sinos do discernimento
se calam nas quebradas do silêncio,
ou no isolamento proposital
e poeirento dos campanários. 

As falácias da tecnologia
esgotam a inteligência
dos que medem consequências,
e, depois, desaparecem no esquecimento.

(Tradução de Marco Fusini) 

Il mondo mi pare impazzito,
ben piu di quanto lo sembra,
conforme lo si prova
nei meandri della storia. 

Le peronne battono meno
le mani in conscenza,
e le tasche dettano le regole
nelle attitudini incontestate.

Nelle campanne del arbitrio
si taciono le rotture del silenzio,
comme un isolamento intenzionale
e polverento dei campanilli. 

Le sophisme della tecnologia
esauriscono l'inteligenza
di quelli che misurano le consequenze,
ma, per poi, spariscono nella assenza.... 

domingo, 22 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (231)


A cada um suas ó/missões!
De nada adianta precipitar
o, de antemão, traçado rumo
tortuoso ou reto,
sem perder o prumo.  

A cada um o seu quinhão
de prazeres merecidos,
ou dissabores inevitáveis,
de irretocável currículo.  

Aguardam-se os momentos,
cumprem-se os prazos,
sem tantos avanços,
ou grandes atrasos. 

Passam-se os dias, em correrias,
para se ganhar o tempo terreno,
de preferência com mais harmonias,
sintonias, sinfonias,
e mais outros guias. 

Caso não se possa esperar
pelo curso normal da corrida,
que, ao menos, se mereça guarida,
com mais alegrias, e mais vidas.

sábado, 21 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (230)


(Para Mimi Lajous, lembrando Paris dos anos 70)

Paris sempre há de ser luz,
o que muda são os penteados,
as feições e rostos,
as fantasias e prédios,
as canções, os prazeres e alegrias,
ou, mesmo, os tédios, por ironia.  

Paris devra être toujours lumière,
ce qui change ce sont les coiffures,
les apparences et visages,
les fantaisies et bâtiments,
les chansons, les joies et plaisirs,
voire, même, les ennuis, par ironie. 

Mudanças vão acontecendo,
sem que se lhes dê reparos,
imperceptíveis e quotidianas atenções,  
até que um dia vêm os acontecimentos, as fotos
para nos levar a variadas sensações.  

Ces changements vont à son train,
sans besoins de gros renversements,
avec des imperceptibles et quotidiennes attentions,
jusqu´au jour où arrivent les événements et les photos
pour nous ramener à des sensations variées. 

Onde, agora, os penteados, as pessoas,
os prédios, as canções, as emoções?
Recolhidos, quem sabe, em capa de saudade?
Maldades dos tempos? Bondades da vida?
Não, sentimentos inerentes ao passar das idades.  

Où, maintenant, les coiffures, les personnes,
les bâtiments, les chansons, les émotions?
Reccueillis, peut-être, sous cape de nostalgie?
Méchancetés des temps? Bontés de la vie?
Non, des sentiments dus aux jours durants.
 
 

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (229)


É chegada a hora,
em que não há mais jeito
de, atento, observar
o tempo passar,
sem que se extinga,
o ânimo, à míngua.
 


Passou-se mais um dia, como os de ontem;
passaram-se noites, como já outras mais,
de insatisfações, pensares de ousadias;
passam-se, hoje, nuvens brancas,
carregadas de vontades tardias
de chover fecundidades
cheias de novidades:
mesmo que sendo
de poesias vadias.
 

Correm do tempo,
com a morte aos pés.
Não olham para trás,
que tanto faz.
A parceira é fatal,
de inabalável propósito,
no cômputo geral!
 


Dizia que corria
da morte.
Não seria da má sorte,
que bem cedo
o levaria?

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (228)


Busca-se amor intenso,
seja de que jeito for,
físico, platônico,
lacônico, tagarela,
de almas e corpos enleados,
presentes nos desejos e beijos
dele e dela, sem janelas.  

Amor que não trema,
mas que se extreme,
ou estremeça,
que não crie ramas
ou dramas,
que recomponha as tramas
do gesto do desprendimento,
que agregue valor maior
no desvencilhar da dor,
tais os amores materno,
paterno, fraterno,
ternos, eternos
e o que mais for de valor.
O amor se veste, inconteste
de diferentes cores.
 


 
O que falta, nos dias de hoje,
na mesa e no coração,
são o arroz, o feijão e o pão,
o amor, a paz e o perdão,
o silêncio, o sono e o emprego,
o desapego ao torrão e o sossego,
os abraços, o desvelo e os laços,  
a abnegação, inerentes à doação,
antes, durante e após a comunhão.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (227)


Enquanto uns, os outros...
enquanto o calor, o frio,  
enquanto o belo, o feio,
enquanto as asas, o freio,
enquanto o dia, a noite,
enquanto o apetite, o boia-fria,
enquanto a alegria, a tristeza,
enquanto o brilho, a desarmonia,
enquanto as notas, o do-mínio,
o re-tardo, o mi-lagre, o fa-tídico,
o sol-erte, o lá-tego,
o si-lêncio de poucos brios... 

Enquanto os nós das bravatas,
penduram paletós de gravatas,
aliviam a uns e enforcam a outros,
na mata, os cipós entrelaçam dores,
mais apertam do que relaxam,
à vista de cós de calças e despudores,
de sapatos de dedos pedicurados,
de pernas em azadas perambulâncias,  
por corredores climatizados, 
vocês e eu teremos menos valores,
por ignorâncias levados...

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (226)


(Roteiro para quem vai a São Tomé e Príncipe)

Sem perder tempo,
fazer roteiro verdadeiro,
usar pena e sentimento sincero,
anotar falares, dizeres,
recolher ideias maiores,
que regam terras,
e vida e valores. 

Pensar com amor e coragem,
falar de alma aberta e coração,
apagar dores escondidas
de miséria à flor da pele,
de segregação reclusa, obtusa,
de interesses escusos.  

Dirigir-se com jeito, e proveito,
às pessoas carentes, decentes,  
que se orgulham da raça;
olhar nos olhos, nas linhas do rosto,
sem nada cobrar de gestos,
que não sejam de graça. 

Comprovar que respeito mais vale
que ouro e prata de suores gastos,
guardados em cofre de ricaços,
longe de lenitivos das dores,
ausentes dos infinitos desejos
de cultivar amor e vida melhor.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (225)


Gastam tempo e papel,
gastam dentes e salivas,
gastam mármore e cinzel,
gastam telas, tinta e pincel,
gastam ciência, bolso e suor,
gastam mente, massa cinzenta,
gastam mais do bom, do melhor. 

Muito gestam, bem pouco criam,
gozam, gastam, gostam à revelia,
quando chegam a fazerem algo,
já vem carregado de avarias.
Mas como nada dissemos,
já nada podemos dizer,
não é, poeta Eduardo
Alves da Costa?


 

Todo erro tem conserto,
todo aperto tem descanso,
toda corrente tem remanso,
todo palpite tem efeito,
todo começo tem limite,
todo defeito tem solução,
só os desejos de perfeição
carecem de jeito e precisão.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (224)


(Pedras que tantos pés pisaram, mãos alisaram...)

Não sei se este texto está terminado. Ao leitor de o refazer a cada leitura.

Que falem as pedras
desse mundo empedernido,
falem dessas gentes,
desses gerais profundos,
trazidos de dentro da alma,
à tona das mentes producentes. 

As pedras dos muros de pedras,
das pedreiras em profusão pelos caminhos,
dividem as terras e os homens que as tocam,
desde os sopés dos montes e colinas,
das montanhas aos mais altos cimos,
dos ânimos   

Das muralhas da China às pirâmides do Egito,
dos palácios e esculturas da Grécia
à Roma dos arcos e circos, que a plebe agita,
das milimétricas formações incas e maias,
dos seixos soltos das encostas e sendas peregrinas,
sempre elas, as pedras, a darem firmeza e guarita.  

Das escadarias das igrejas e casarões barrocos,
das tapiocangas dos cerrados e solidões,
às ruas de cidades de Minas e Sertões,
as pedras alicerçam as paisagens ferrenhas,
enegrecidas nas mãos dos escravos-mina.  

As pedras são as mais puras testemunhas
da história da Terra, dos quantos humanos
migram, em milhões de anos,
tomando-as nas mãos, varrendo-as com os olhos,
a procurarem os melhores ângulos da segurança,
para, depois, se encolherem em seus cantos,
e esculpirem a memória de feitos e encantos.

domingo, 1 de setembro de 2013

Pensares a conta-gotas (223)


Esses pássaros mágicos que ora sobrevoam, em liberdade,
a Carélia, de ilhados monumentos, à beira lagos,
e pousam sobre cercas assinaladas pelos tempos,
nesses lugares ermos, recônditos, frientos,
teriam, ainda, como nós, debilitados seres humanos,
a consciência dos avós de mil milhares de anos? 

O que somos, o que fomos, o que seremos,
para os muitos de nós, que virão, em comitivas,
confrades, providos de memória e ânimos,
se a tanto permitirem as mentes lucrativas? 

Por quanto tempo, ainda, conseguiremos ser,
tais pássaros pousados sobre estacas, independentes,
à procura do que dizer, como sempre dissemos,
de como sobreviver, por que tempos e finitudes
continuaremos a voar, sem perdermos o rumo,
nessas e noutras, embora longínquas, latitudes?