domingo, 27 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (61)

 

La technologie s´étant substituée à la nature, de celle-ci il ne serait même plus question!” Tradução livre:

Caso a tecnologia venha a tomar o lugar da natureza, desta, nem mesmo se ocupará mais.”

Jean-Marie PELT – Pierre RABHI, Le Monde a-t-il un sens? Fayard, ParisVilleneuve d´Ascq, 2014, p. 131.


Quem não pede ajuda a quem?

 

Quem independe de quem?

O homem da natureza

ou a natureza do homem?

A facilidade da necessidade 

ou a necessidade da fatalidade?

 

A tecnologia comanda o vento,

a chuva, o ar, o sol,

a água e o solo do alimento,

ou os elementos dominarão

a tecnologia?

 

Sejamos humildes, realistas,

caso volte a época da pedra à mão,

as caças de comida, com arcos e flechas

sem riscos de pedradas adversas,

retornarão.


.

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (60)

 

Por aqui, o sol nasce

e se impõe,

no percorrer do céu sem véus,

medindo tempo e espaço

de não morrer de escrúpulos,

mesmo com estertores de cores

do crepúsculo.

 

Nuvens não se escondem,

por muito tempo,

no seu vagar de momentos.

Longas águas as aquecem,

límpidos ares as desvelam,

natureza as circunda,

e pássaros que as tecem.

 

Por lá, o sol se levanta

quatro horas mais cedo

e se põe a trabalhar,

o dia inteiro, sem parar,

sem se dar a folguedos

de outro linguajar

e enredo.

 

Já de tarde, vai se deitar,

sem alardes, para descanso,

por ter de, “au lendemain”,

voltar ao ponto primeiro,

refeito e pronto,

do circuito obreiro

do picadeiro.

terça-feira, 15 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (59)

                                                             In vino, veritas! In médio, virtus!

“Pulchum est quod visum placet” (Tomás de Aquino)

 

Entidades dominantes condenam prazeres.

Corpo pede conforto, lassidão, necessidades.

Seis sentidos regem sete pecados capitais.

Lei do menor esforço, acomodação e complementos.

Animais obedecem, humanos reprovam instintos,

que enfraquecem almas, perdem guerras,

destroem impérios, recriam labirintos.

 

Cale-se a voz dos sentidos

(visão, audição, olfato, paladar, tato, intuição).

Acalmem-se os pecados capitais

(gula, preguiça, luxúria, orgulho, avareza, inveja, ira),

vias por onde adentra a perdição!

 

Silenciem-se as gritas do corpo,

frades místicos se mortificam, ciliciam-se!

Sexo vê, desejos ouvem, perfumes extravasam,

sabores absorvem, carícias afagam,

sentimentos afloram, beijos comem línguas,

engolem o outro, como procriam insetos no cicio.

 

Instinto intui potencial de possibilidades,

com certezas de que o ser é sempre capaz.

Deus foi quem deu a vez e os vieses do sentir,

para o bem da humanidade.

 

Belezas visuais, gêneros, indistintamente.

Flores, estames, pistilos, anteras, vagens, cores,

palavras, letras, cantos, esculturas gregas, et alii.

Artes cultuam os órgãos genitais,

reverências no respeito das espécies,

que o homem primitivo perpetua,

na sacralidade e saciedade do sexo.

 

Sociedades, no conjunto de leis coercitivas

inibem os divertimentos e os apelos sensoriais.

O pecado requer matar o próximo,

a criação e a vontade divinas.

Os males advêm da privação dos desejos

de quem procura alegrias e farturas, sem pejo.

Por que de fora sexualidade, prazeres, procriação,

tudo tem nexo, por essa vastidão de mundão de Deus,

côncavo e convexo, universo chamado de céu?

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (58)

 De tudo, mais um pouco 

 

Voo nas alturas do pássaro,

olhando o vazio do espaço,

buscando o máximo de prazer,

que, sem nem mesmo conhecer,

ainda de saber me p/resta voar.

Vislumbro o longe inacessível,

avistando o mais próximo possível.

 

Durmo à noite sempre mais tarde,

para me acordar de manhã mais cedo,

pensando em mais conquistar

de mundos com mais liberdade,

sem que me domine o fatídico medo.

 

Desejo cada vez mais um pouco

de um quase tudo da vida, 

aos poucos, nutrindo impulsos vários

de pensares os mais fecundos.  

 

Mas já, agora, um tanto alquebrado,

sem ação e de menos tempo,

passo a conviver, mesmo cansado,

partilhando minguado alento,

com gentes, sem mais intento,

que se contenta em aceitar o presente,

sem superar indisfarçável pesar

de existência irreversível.

quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (57)

 

Nossas fotos antigas,

cuidadosamente guardadas,

não mentem em nada

sobre nós e nossa efígie,

em presentificável passado.

 

O tempo pode tê-las esmaecido,

mas lá estamos nós,

sorrindo, abraçados

a nossos sentimentos

alegres, sofridos, embaçados.

 

A sinceridade da face é a mesma

com leves disfarces nos traços,

só, agora, mais verdadeiros.

O tempo pode nos ter conservado

embaces corriqueiros, mais fantasiados.

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Migalhas de Mim (56)

Texto-comida, de se comer

com papilas e olhos de artistas.  


Pensa, um tanto preocupado,

que seu poço possa secar,

sem mais nenhum proveito

de abrir o pote do peito,

encontrar o de que falar e escrever,

que ainda não tenha sido dito

ou escrito, com cuidado bendito;

 

Vem-lhe umas mínimas ideias,

uns fortes desejos de formular

receitas de vidas bem vividas,

acompanhadas de leves temperos,

ainda não usados nos lida-lidas,

para dar mais assazonados gostos

às frugais variantes da comida.

 

Em menores repastos condimentados,

pitadas de sais, cereais e sementes,

que sabem satisfazer as vontades

de enxergar mais mundos diferentes,

imaginados com enfoques no amor,

nas cores atraentes, a serem servidas,

sob grossas lentes de aumento

e mais rigores nos sabores da comida.