sábado, 28 de novembro de 2015

Cantos e (des)encantos 11


O que mais na vida conta
do que
o que conta a vida?

Não fazer de conta
viver sem medo
dar desconto à dor
respirar de cor o novo
e recontar o amor.


            



Fácil não é
nunca foi
nunca de ser será
esconder-se de si
fazer de conta.

Falsidade não existe
pronta!

sábado, 21 de novembro de 2015

Cantos e (des)encantos 10


(Paisagem)

Como se aportasse n'outro planeta

sem mapa, bússola, ou luneta

exploro-me por dentro,

paisagem alagada e sem margem,

para assistir-me sozinho no centro,

ao relento.



Procuro nesta vastidão de céus sem cantos

minha própria imagem perdida

que me descortina o indefinido

de minha sina.



Neste largo vazio sem reta nem rota

nãocomo me ocultar

se quem chega sou eu em derrota

que nem  reconhece o lugar

onde a porta?



              


(Fugas)

Insisto-me na larga do viso

entrego-me à loucura de improviso

da caminhada irreversível e dura

de um sonho in-verso.



Esqueço-me das gentes daninhas

insignificantes transeuntes do ganho

a se apagarem no mapa vazio das guerras.



Evado-me de mim e desse mundo tacanho

volatilizo-me no espaço sideral sem fim

perco-me no tempo profundo

calo-me impotente

perante a postura infame

dos pré-tensos donos de vidas.



Diluo-me no mar dos esquecidos

náufrago sou descontente com tudo

ainda provido de mente e juízo

e, assim mesmo, continuo mudo!

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Cantos e des(encantos) 9





(Limitação)

                                                          



O que de mais desgosto

do que a certeza

de se saber cercado

de espaço e tempo

limites sem fim

que me permitem

o voo azado e livre

para além de mim?

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Cantos e des(encantos) 8


(Prisioneiro de mim)



Condenado ao movimento

observo a vida em voltas

nas árvores que não param

de folhear o vento.



Da janela, um homem

corre atrás de si, atrasado

sem se saber demente como eu

prisioneiro do tempo.



Para das fronteiras azuis vazadas

o vazio, o vácuo perpétuo, a infinita escuridão

o desconhecido me convidam

à uma viagem sem destino certo.



Olho fixo os pássaros

que fatiam o ar

pressinto um calor de liberdade

um ensejo que não é mais prisão.



A vista cansada

a memória esgotada

a marca na alma

um mal traçado currículo.



Viverei em longes sóis e estrelas permanentes

de luas a se revezar em céus multicolores

um lugar qualquer nos espaços ilimitados do mundo

estará a minha espera após a morte, de novo à vida.



Sonho e não sei sonhar

vivo sem saber viver

a força de tudo depende de mim

que preciso alcançar o fim do sofrer

                                          para merecer a justa coerência dos sóis.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Cantos e des(encantos) 7


(De tempos em tempos)




O que ora passa

passou.

De que adianta voltar

atrás?

O tempo que nunca espera

jamais será capaz

de ré-voltar esta Esfera.



Procuro agora

momentos que ainda virão

na ânsia de atrasar meu tempo

mesmo se grito aflito

ao finito.



Quando o agora for passado

também o depois já se terá findado.

Por onde, então, andarei meu tempo

que jamais se deixa alcançar

em tempo?



Viajo para mudar o

mas inverto passos

esper´ando sempre voltar

ao instante primeiro

o único talvez lugar

onde tempo e espaço

não me delimitem

nem me conflitem

em eterno presente

com-fundidos.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Cantos e des(encantos) 6


(Fome)



O caminho

sobe o morro

se contorce

leva à casa

morre à porta

sabe a dor.



O barraco

não tem porta

nem janela

nem entrada

sem de dentro

de ente doente

cegado

calado de fome!



Ô de casa!

?...

Ô de dentro!

?...

Ô ninguém!

?...

Ô da fome!



Caminho!

apaga no mapa

a miséria deletéria

aos que sobem

aos que sabem

serem ele e ela

e/feitos de homens!

domingo, 8 de novembro de 2015

Cantos e (des)encantos 5


(Música)



Divina música

sonho

a que céus mi levas

assim tão pluma?

Voos de pássaros

furam água e ar

ma e espuma?



Música, aponta-mi

assim tão cil

os encantos

e mi viaja numa clave

de sol

e z-mi ir

para de mim...




Música, até onde és sentida


si o infinito

é mesmo, assim, infindo

e tem sede de si-

lêncio e sons

e/ternos?



Música, alivia

meus momentos

de pensador.

Quem sofre não tem

nem si nem

de-amar,

só alegrias de si -ar.

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Cantos e (des)encantos 4


(Solunar)




Sol e lua solunam

numa luz

luzem

e amam.



Lua luz o sol

luz o dia

notívaga gira

gerando luar.



Sol fogo e faca

fere e fura

incêndio

macho em cachos

jorra sementes

madura cria

atura.



Lua leite em favos

entreaberta fava

gema e clara

luz em sol

fêmea fecunda.



Minguante

nova

crescente

luz ente lua

cheia de amar

de se ver

clarividente

brilhante de amor

amante ardente.



Másculo fêmina

hino de hino divino

luando à vida

luz vindo

luz indo

alando

luslindo.



Soluno: amo a vida

ao sol de lua linda!

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Canto e (des)encantos 3





(Cemitério)




Fervilha a cidade,

o Cristo

aponta o vazio,

abraça o barulho

dos vivos,

que alargam espaços,

em movimentos comparsas,

e borbulham

com passos de formigas,

gestando a vida

de arrastos.



O cemitério

resume a cidade,

reúne a quietude,

a solitude dos mortos,

silencia o efêmero,

estampado

nos rostos enfermos.



Bem mais populoso,

é, contudo, pequeno,

compacto terreno,

canteiro de ex-gentes,

diferentes em vida,

aqui lado a lado,

estendidas,

eternamente adormecidas.