sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Contos contados de Minas (31)

A Mulher de pau

A vida nos reserva fatos que mais nos fazem relembrar do que esquecer. Por isso mesmo difíceis de se calar ou de não se escrever. Um desses foi o ocorrido, há tempos, em um recanto mineiro, que, não fossem os preconceitos sociais de colorações diversas, nenhuma repercussão teria merecido. Mas vamos ao caso, que tardar seria menos falta de complacência que de clemência.
A notícia correu a cidade: um homem tinha sido preso, e o crime caracterizava atentado ao pudor e aos bons costumes. O acusado, morador na roça, sozinho, desgraçado da sorte, vivia isolado dos demais seus congêneres. Seus hábitos arredios pareciam excêntricos, e acabaram por chamar a atenção dos vizinhos. Algum moleque, à surdina, foi inspecionar o que o ermitão fazia em casa, naquela solidão de casebre de telha colonial e janela de tábua frestada, o mais das vezes fechada. E o olhar do curioso pôde divisar o que dentro se passava. O esquisitão confeccionara uma mulher de pau, de tamanho natural, tosca, que expunha na altura da genitália, um avantajado óstio. Por ali, satisfazia as necessidades, quando carecia de carinhos.
Mas, se isso, por si , poderia dar o que falar, o que chamou mais a atenção das pessoas, que passaram a comentar maliciosamente a descoberta, foi o artifício que o solitário inventara, para aproximar-se mais da realidade fisiológica e aumentar-lhe o prazer do ato. Ele esquentava na panela de ferro, na trempe da fornalha, um preparado de mamão ralado e o colocava no orifício apropriado, para dar àquele corpo de madeira, inerte e frio, o calor que lhe fazia lembrar o de corpo humano, que ele, talvez, nunca pudera, ou nem mais pudesse, ter a seu lado. Somente a fantasia poderia se encarregar de atribuir vida a objeto tão mal esculpido, e completar-lhe as formas, para o que se prestava.
Enquanto isso, insatisfeitos com a pouca divulgação de tão inusitado fato, nascido de um tão bem resguardado segredo, os moradores do lugarejo deram com a língua nos dentes em lugares mais adensados. Foi como espalhar ao vento as penas de um pato gordo. Corrida a notícia, a polícia foi instada a prender o ardiloso acusado. Seu crime merecia a execração pública, já que satisfazia suas naturais carências de prazer, com os tais engenhosos artifícios, no lugar de procurá-los, como todo mundo, nas bênçãos dos altares, cartórios ou lupanares.
Agora, o acontecido nada mais servia do que proporcionar prazeres às imaginações de pessoas de cabeças tão ocas quanto o buraco cavoucado no tal manequim de madeira. Naquela altura dos acontecimentos, nem as divindades seriam capazes de recolher as plumagens esvoaçantes da difamação. Talvez um Freud fosse capaz de explicar o quanto o ser humano carece de satisfazer as humanas necessidades, e ser o sexo, assim, tão indispensável, para regular o equilíbrio humano, tanto para os que o tem em profusão, quanto para os que dele carecem em perdição. Os sex-shops e a filmografia correlata, com tão grandes presenças e inovações nos dias correntes, poderiam ilustrar melhor esta busca de respostas para tais indagações.
Do fim que deram ao desequilibrado homem não se tem notícias. Presume-se que o coitado tenha sido solto, regressado ao seu abrigo, para gáudio das malícias e maledicências de quantos desconheceram as saudáveis regras da convivência dos contrários e dos carentes.
            Quem sabe, também, sua mulher de pau não tenha vindo servir de consolo para alguns daqueles piedosos detratores que o condenaram com tanta veemência e presteza. Ou, então, para aqueles que o assistiram detrás das grades, carentes de carinhos, que a liberdade do ir e vir pode conceder. Ou, até mesmo, tenha servido de inspiração a fabricantes de objetos infláveis, ou siliconizados, para um comércio cada vez mais delirante, à procura de sanar disfunções de mentes despossuídas de aconchego e consolo! A complexidade das almas comunga com sua intolerância inata

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